sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Suspenso


Fecho os olhos. E o tempo pára ali.
Volto a abrir para ver como é, mas o instante assim ficou… Imagina...
Suspenso.
Para que eu não passe por ele sem o olhar.
E eu olho.


E descubro um Mundo que nunca vi, nem pensava que existisse.
Descubro de que cor é o azul e o verde.


Descubro a que cheira o limão acabado de colher.


Descubro a que sabe o pão quando é amassado pelas minhas mãos.


Descubro que os pardais conseguem cantar mais alto que os aviões que não param.


Descubro o brilho que os olhos castanhos encerram e a misteriosa luz que sai de um sorriso cândido.


Descubro a transparência da voz da criança que salta à macaca e a maciez das mãos enrugadas e calejadas do pai.


Descubro a infinita grandeza de uma noite estrelada na aldeia onde o céu não tem limites e onde os homens ainda não quiseram pôr luz. Ilumina-o a transparência do luar, como se qualquer outra fonte desfigurasse aquela terra de pureza e dureza.
Descubro o cheiro da terra quando o sol bate nela.


Descubro as histórias que são tantas, demasiadas, para serem contadas num fôlego... Que são tantas, demasiado íntimas, para serem contadas a qualquer um… Qualquer um que as oiça sem lhes sentir o peso. Sem lhes respirar a vida que está por trás. Quando um segredo se conta muitas vezes, banaliza-se, perde-se.
Talvez por isso este instante não deva ser colhido por todos. Para que não se gaste. Para que mantenha sempre esta frescura. Para que tenha de ser procurado apenas pelos olhos capazes de fazer silêncio. E de esperar. Só quem se cala pode ouvir a vida que ele encerra.
Descobri que a maior parte dos gestos são muito mais do que só gestos, dos quais nem colho a metade. Descobri que as palavras acariciam a alma tal como os cabelos o vento mansinho que alegra a manhã... Que essas mesmas palavras, que são o melhor que temos, dizem tão pouco do que quereria e poderia dizer. Não sei dizer mais. O resto senti-lo-às tu.
Descobri que somos muito mais bonitos quando nos olhamos devagarinho, sem pressas, sem tempo, registando na memória cada imagem, guardando o calor de cada respiração. Perdemos tanto uns dos outros!... Descobri que um abraço é mais doce que a aletria que a mãe faz e que a nossa alma tem ainda mais necessidade dele que o nosso peito e os nosso braços que sabem mais depressa pedi-lo que ela.
Não é só nosso isto… também o céu se agarra à terra, numa linha tortuosa salpicada de neve a que chamam Estrela, transformando o horizonte num abraço infinito e eterno.
Para nos recordar que o nosso destino é a comunhão. Essa união do que temos em comum é aquela que se colhe no instante: infinitos que procuram infinitos, para partilhar o infinito desejo de se darem e de se receberem, nessa troca de vidas a que se chama Amor e cujo desejo provoca um prurido chamado saudade.
Hoje, antes de fechar de novo os olhos e de novo os abrir para seguir para a vida de acordo com o relógio, fiz o propósito de viver mais devagar, fotografando cada instante.
E assim, suspenso, poder bebê-lo todo e sentir que sou mulher e estou viva.






Ao fotógrafo que me ensinou a olhar para a história dos instantes
Lisboa, 24 de Fevereiro de 2009



Sem comentários:

Enviar um comentário